portugal e o futuro

ouvi ontem no excelente e imperdível programa do carlos vaz marques, "pessoal e transmissível" da tsf uma entrevista com o escritor angolano josé eduardo agualusa onde ele caracterizava um dos personagens do seu último livro "as mulheres do meu pai": um jovem africano, nascido em portugal que escolhera ser português quando chegou à idade de optar por uma nacionalidade. numa certa passagem do livro cruzou-se o jovem com um taxista que lhe perguntou de onde é que ele era ao que o jovem respondeu "sou português". perante as dúvidas do taxista disse o jovem que ele era mais português do que o condutor do taxi que se limitara a nascer em portugal e era português porque era, enquanto ele, que tinha opção, "escolhera ser português por convicção".
pensei nestas palavras e nas outras que agualusa coloca na boca do personagem quando afirma que "não quero saber das raízes porque raízes têm as árvores e eu não sou árvore".
estive nestas últimas horas à janela a pensar em tudo isto, enquanto olhava as estrelas que furam as nuvens que passam por lisboa, e sou obrigado a reconhecer que estas convicções também funcionam ao contrário.
estou desiludido com o facto de ser português neste portugal que temos hoje em dia.
à beira de iniciar a minha licenciatura em história tenho andado às voltas com a memória e verifico que portugal já foi grande, enorme, mas agora corre o risco que se transformar num imagem difusa dessa grandeza.
um amigo meu, sportinguista, dizia esta semana que "portugal já parece o benfica: vive das glórias do passado". mas se ao benfica eu reconheço sinais de recuperação já a portugal apenas antevejo que daqui a 20 anos estaremos cada vez mais na cauda da união europeia, tristes, desolados, solitários.
vivemos num portugal onde a classe política, na sua grande maioria, não tem dignidade, honra e génio para honrar o passado de portugal e projectar o futuro.
vivemos num portugal onde a justiça apenas o é para aqueles que têm dinheiro para manobrar, jogar e manipular os homens que deviam executar a justiça de forma justa.
vivemos num portugal onde o caciquismo impera e onde os corruptos vão fintando a justiça e continuam a viver em grande usando as paixões populares a seu belo prazer e usufruto.
vivemos num portugal onde alguns politicos pensam ser reis e se perpetuam impunemente.
vivemos num portugal que esqueceu os portugueses, os espezinha, trata mal e apenas deles se lembra quando "cheira a votos".
vivemos num portugal que não é de todos nem para todos e onde nunca "tantos se aproveitaram de tão poucos".
não quero saber das raizes porque como o personagem do livro do agualusa eu também não sou árvore, não quero ser português apenas porque nasci em portugal, queria ser português por opção, por honra, por orgulho e isso infelizmente não acontece.
não posso mudar o mundo sozinho posso apenas tentar mudar o meu mundo, aquele onde vivo e onde vivem os que amo e esse mundo só será passível de ser mudado se eu mudar de mundo...

Comentários

Anónimo disse…
O José Eduardo Aguallusa é angolano de Alenquer, não é importante mas é um pormenor, eu nasci em lisboa mas pouco lá vivi, sou Lisboeta?
Anónimo disse…
Meu caro
Ninguém valoriza mais Portugal do que aqueles que vivem lá fora.
Ninguém desvaloriza mais Portugal do que aqueles que vivem cá dentro.
No entanto, são os portugueses de dentro que não podem deixar cair Portugal. Alguém tem de carregar a cruz, com a beleza da memória.

Unas

Mensagens populares